30.11.10

fernando pessoa


Passam hoje 75 anos sobre a morte
de Fernando Pessoa.

de Pessoa poderia falar da solidão ou do desassossego,
do Orppheu ou do sensacionismo,
da intimidade ou do mistério,
da Mensagem ou da heteronímia.

Poderia falar de tudo e tudo ficaria por dizer.


"... Há três espécies de Portugal, dentro do mesmo Portugal; ou, se se preferir, há três espécies de português. Um começou com a nacionalidade: é o português típico, que forma o fundo da nação e o da sua expansão numérica, trabalhando obscura e modestamente em Portugal e por toda a parte de todas as partes do Mundo. Este português encontra-se, desde 1578, divorciado de todos os governos e abandonado por todos. Existe porque existe, e é por isso que a nação existe também.

Outro é o português que o não é. Começou com a invasão mental estrangeira, que data, com verdade possível, do tempo do Marquês de Pombal. Esta invasão agravou-se com o Constitucionalismo, e tornou-se completa com a República. Este português (que é o que forma grande parte das classes médias superiores, certa parte do povo, e quase toda a gente das classes dirigentes) é o que governa o país. Está completamente divorciado do país que governa. É, por sua vontade, parisiense e moderno. Contra sua vontade, é estúpido.

Há um terceiro português, que começou a existir quando Portugal, por alturas de El-Rei D. Dinis, começou, de Nação, a esboçar-se Império. Esse português fez as Descobertas, criou a civilização transoceânica moderna, e depois foi-se embora. Foi-se embora em Alcácer Quibir, mas deixou alguns parentes, que têm estado sempre, e continuam estando, à espera dele. Como o último verdadeiro Rei de Portugal foi aquele D. Sebastião que caiu em Alcácer Quibir, e presumivelmente ali morreu, é no símbolo do regresso de El-Rei D. Sebastião que os portugueses da saudade imperial projectam a sua fé de que a famí1ia se não extinguisse.

Estes três tipos do português têm uma mentalidade comum, pois são todos portugueses mas o uso que fazem dessa mentalidade diferencia-os entre si. O português, no seu fundo psíquico, define-se, com razoável aproximação, por três característicos: o predomínio da imaginação sobre a inteligência; o predomínio da emoção sobre a paixão; a adaptabilidade instintiva... ", Fernando Pessoa, Sobre Portugal - Introdução ao Problema Nacional

29.11.10

telhados


já não há telhados assim

as telhas de canudo
moldadas nas coxas doridas,
as lágrimas de chuva
ritmadas como o relógio do tempo,

as andorinhas
filhos pródigos de todos os anos,

as ervas
de raízes ao sol, à chuva e ao vento,
as sombras
de nostalgia ampliada...

... gosto do ocre, gosto de telhados assim.

                                                                                                          
 (fotografia de octávio oliveira)

alentejo




no alentejo
a lua não finge
o sol não se esconde
o tempo não foge

no alentejo
o velho não chora
a chuva não molha
o tempo não foge

a vista não cansa
a dor não se sente
o tempo não foge

gosto do alentejo
onde o tempo não finge
e a lua não foge

(poema vencedor do Concurso de Poesia da Biblioteca Municipal Florbela Espanca de Matosinhos, dezembro 2010)

preguiça


este é um blog para me ir espreguiçando
devagar, mastigando o tempo
gota a gota, palmo a palmo
pé ante pé...