Passam hoje 75 anos sobre a morte
de Fernando Pessoa.
de Pessoa poderia falar da solidão ou do desassossego,
do Orppheu ou do sensacionismo,
da intimidade ou do mistério,
da Mensagem ou da heteronímia.
Poderia falar de tudo e tudo ficaria por dizer.
"... Há três espécies de Portugal, dentro do mesmo Portugal; ou, se se preferir, há três espécies de português. Um começou com a nacionalidade: é o português típico, que forma o fundo da nação e o da sua expansão numérica, trabalhando obscura e modestamente em Portugal e por toda a parte de todas as partes do Mundo. Este português encontra-se, desde 1578, divorciado de todos os governos e abandonado por todos. Existe porque existe, e é por isso que a nação existe também.
Outro é o português que o não é. Começou com a invasão mental estrangeira, que data, com verdade possível, do tempo do Marquês de Pombal. Esta invasão agravou-se com o Constitucionalismo, e tornou-se completa com a República. Este português (que é o que forma grande parte das classes médias superiores, certa parte do povo, e quase toda a gente das classes dirigentes) é o que governa o país. Está completamente divorciado do país que governa. É, por sua vontade, parisiense e moderno. Contra sua vontade, é estúpido.
Há um terceiro português, que começou a existir quando Portugal, por alturas de El-Rei D. Dinis, começou, de Nação, a esboçar-se Império. Esse português fez as Descobertas, criou a civilização transoceânica moderna, e depois foi-se embora. Foi-se embora em Alcácer Quibir, mas deixou alguns parentes, que têm estado sempre, e continuam estando, à espera dele. Como o último verdadeiro Rei de Portugal foi aquele D. Sebastião que caiu em Alcácer Quibir, e presumivelmente ali morreu, é no símbolo do regresso de El-Rei D. Sebastião que os portugueses da saudade imperial projectam a sua fé de que a famí1ia se não extinguisse.
Estes três tipos do português têm uma mentalidade comum, pois são todos portugueses mas o uso que fazem dessa mentalidade diferencia-os entre si. O português, no seu fundo psíquico, define-se, com razoável aproximação, por três característicos: o predomínio da imaginação sobre a inteligência; o predomínio da emoção sobre a paixão; a adaptabilidade instintiva... ", Fernando Pessoa, Sobre Portugal - Introdução ao Problema Nacional
2 comentários:
Acho este texto fantástico, como aliás quase tudo o que foi escrito por ele!
Fernando Pessoa teve uma grande influência na formação da minha personalidade.
Descobri-o aí pelos meus 16 anos, era então estudante do Liceu D. João III em Coimbra.
A partir daí, dado que na época (1964) não era fácil o acesso a livros e, relativamente à obra dele, muitos nem sequer estavam publicados, foi na Biblioteca Geral - aquele grande edifício à esquerda para quem acede à Faculdade de Direito - que perdi horas e horas com os seus versos, os heterónimos, as complexidades e simplicidades.
O "engenheiro Álvaro de Campos" sempre foi o meu preferido.
Genial!
concordo inteiramente, este texto é genial.
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