Ora
aí está! Depois das especiarias dos descobrimentos, do ouro do Brasil, das
remessas dos emigrantes e dos fundos comunitários, eis que aí vem mais uma
enxurrada de milhares de milhões de euros.
Tentei
ler as 289 páginas do novo QREN, o chamado “Portugal 2020”. Desisti
rapidamente. Apesar de tudo, sempre é menos complicada a leitura do Ulisses do James Joyce ou mesmo do Tratado das Paixões da Alma do Lobo Antunes.
Haverá
quem diga que, conceptualmente, o documento é quase perfeito, que é necessária
uma visão estratégica, que o que importa é quem exporta, que a Europa é fixe e
o portuga que se lixe, bla, bla,
bla...
Tenho
para mim, que é mais do mesmo, uma prosa já lida, um filme já visto, um
resultado viciado.
No
tempo da outra senhora, havia informação a menos, agora fabrica-se informação a
mais.
Alguém
acredita que as pequenas e médias empresas irão ler um texto tão longo como um
livro do José Rodrigues dos Santos? É óbvio que, para a esmagadora maioria de
nós, ou seja, para o País real, trata-se de um inenarrável documento para
ninguém ler, por forma a que alguns lobbies bem posicionados e relacionados,
chamem a si a carne do lombo de mais um bodo aos pobres, perdão, aos nobres.
O
texto poderia ser mais preciso e conciso, mais concreto e objectivo?
Poder
podia, mas não era a mesma coisa. Se o fosse, toda a gente o lia, o percebia e
lá se iria o bem-bom das consultorias, advocacias e outras especiarias.
Enfim,
para que não me acusem de só criticar, aqui vai uma sugestão. Apenas uma, objectiva
e concretizável, assim haja vontade política, porque verbas pelos vistos não
faltarão:
Chega
de projectos megalómanos para os quais se exigem (e pagam) múltiplos estudos,
grandes investimentos, muitos licenciamentos e pouco ou nenhum retorno.
Invista-se
no País real, na reabilitação dos
centros históricos das pequenas e médias cidades. Para isso, temos tudo o que é
preciso: equipamentos e materiais, competências técnicas e recursos humanos. Já
se imaginou o emprego gerado envolvendo milhares de pessoas na recuperação dos
edifícios degradados e na requalificação dos espaços públicos, a fazer girar a
economia local?
Por
mim, já sonho com a lufa lufa dos edifícios em reconstrução e reabilitação. Com
reuniões de obra entre pedreiros e arquitectos, engenheiros, carpinteiros e
pintores, de mangas arregaçadas por uma boa causa. Com o pulsar da gente mais
nova procurando novo conforto nas velhas casas. Com o aconchego dos mais velhos
que ainda lá vivem, mais felizes e menos sós. Com as lojas com clientes lá
dentro e sem as empregadas lá fora. Com as praças e as ruas mais vividas e as
crianças mais alegres e divertidas.
Enfim,
sonho com o deserto no sítio certo e não na desertificação dos oásis que foram
os centros históricos de antigamente.
Se
é para pensar no País real, yes we QREN. Sim nós queremos!
adelino pires | alfarrabista, 7 Julho 2014
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