18.8.14

Yes, we QREN!

Ora aí está! Depois das especiarias dos descobrimentos, do ouro do Brasil, das remessas dos emigrantes e dos fundos comunitários, eis que aí vem mais uma enxurrada de milhares de milhões de euros.

Tentei ler as 289 páginas do novo QREN, o chamado “Portugal 2020”. Desisti rapidamente. Apesar de tudo, sempre é menos complicada a leitura do Ulisses do James Joyce ou mesmo do Tratado das Paixões da Alma  do Lobo Antunes.

Haverá quem diga que, conceptualmente, o documento é quase perfeito, que é necessária uma visão estratégica, que o que importa é quem exporta, que a Europa é fixe e o portuga que se lixe, bla, bla, bla...
Tenho para mim, que é mais do mesmo, uma prosa já lida, um filme já visto, um resultado viciado.

No tempo da outra senhora, havia informação a menos, agora fabrica-se informação a mais.

Alguém acredita que as pequenas e médias empresas irão ler um texto tão longo como um livro do José Rodrigues dos Santos? É óbvio que, para a esmagadora maioria de nós, ou seja, para o País real, trata-se de um inenarrável documento para ninguém ler, por forma a que alguns lobbies bem posicionados e relacionados, chamem a si a carne do lombo de mais um bodo aos pobres, perdão, aos nobres.

O texto poderia ser mais preciso e conciso, mais concreto e objectivo?
Poder podia, mas não era a mesma coisa. Se o fosse, toda a gente o lia, o percebia e lá se iria o bem-bom das consultorias, advocacias e outras especiarias.

Enfim, para que não me acusem de só criticar, aqui vai uma sugestão. Apenas uma, objectiva e concretizável, assim haja vontade política, porque verbas pelos vistos não faltarão:

Chega de projectos megalómanos para os quais se exigem (e pagam) múltiplos estudos, grandes investimentos, muitos licenciamentos e pouco ou nenhum retorno.

Invista-se no País real,  na reabilitação dos centros históricos das pequenas e médias cidades. Para isso, temos tudo o que é preciso: equipamentos e materiais, competências técnicas e recursos humanos. Já se imaginou o emprego gerado envolvendo milhares de pessoas na recuperação dos edifícios degradados e na requalificação dos espaços públicos, a fazer girar a economia local?

Por mim, já sonho com a lufa lufa dos edifícios em reconstrução e reabilitação. Com reuniões de obra entre pedreiros e arquitectos, engenheiros, carpinteiros e pintores, de mangas arregaçadas por uma boa causa. Com o pulsar da gente mais nova procurando novo conforto nas velhas casas. Com o aconchego dos mais velhos que ainda lá vivem, mais felizes e menos sós. Com as lojas com clientes lá dentro e sem as empregadas lá fora. Com as praças e as ruas mais vividas e as crianças mais alegres e divertidas.

Enfim, sonho com o deserto no sítio certo e não na desertificação dos oásis que foram os centros históricos de antigamente.

Se é para pensar no País real, yes we QREN. Sim nós queremos!


                                              
                                                                            adelino pires | alfarrabista, 7 Julho 2014


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